Era uma tarde de sexta feira. O clima já não estava como o de outono como ela tanto gostava. Já não havia folhas secas pelo chão. E, nem o pôr do sol era alaranjado. O tempo passara. Verão, outono e inverno. Primavera. E por esses dias chovia como todo mês de setembro chove. Algumas flores podiam ser vistas por Jim através de sua janela. As flores que ele deixou e ela fez questão de fazer vingar pelo tempo que fosse possível. E foi, por anos.
Jim já não se preocupara com o futuro. Pelo menos não hoje. Não numa época tão bonita e ao mesmo tempo tão triste. Como lhe fazia falta. Como a ausência era-lhe tão sufocante a ponto de mantê-la frente a uma janela, pela qual observava a chuva cair sem trégua pela terra. E, junto sem perceber, caíam suas lágrimas também.
A cortina era de seda e renda branca, e voava pelo espaço curto da sala através do vento gelado que entrava sorrateiramente passando pelos cabelos e vestido de Jim. E ela ali, tentando se desviar do passado, não querendo e nem pretendendo pensar no futuro. Apenas querendo o hoje. O hoje como forma de se aquietar naquele dia. Sem pensamentos. Sem gente. Sem telefonemas. Sem compras. Sem correria. Sem carros. Sem estrada. Sem nada que a tirasse de sua casa. Nem no café que ficava na esquina, onde ela costumava ir quando se sentia sozinha, ela queria ir.Queria ficar só. Com o hoje. Com o presente. Só, apenas com seus pensamentos.
Mas algo a chamou como quem chama feito um imã. Uma fotografia sobre a mesa. Era dele. Era dos dois. Preto e Branco. Ali parados. Intactos pelo tempo que se passou. Algo que ficara marcado em um papel de tempos atrás. Eram jovens. Viviam a vida como quem vive um começo sem fim. Noites de amor. Nas mais grandes ventanias. Tão perto um do outro e ao mesmo tempo tão longe. Se amavam. Se amaram nas noites serenas de outono. De inverno...
Junto à fotografia, um livro já empoeirado pelo tempo. Era o livro de poesias que ela fizera para escrever de seus sentimentos mais íntimos e que ninguém o vira. E agora já não mais escrevera. Perdera a graça. Perdera o fôlego. As palavras. A poesia. Coisas que somente o coração pode entender e qualquer razão não explica. Coisa que somente a escrita pode decifrar, quando os lábios não expressam.
Cada letra, palavra, verso, eram feitos para retratar dias de felicidade e ao mesmo tempo de dor. Por que sofremos tanto por amor? E, ao mesmo tempo ele nos transborda com seu sabor?
Jim usara os papéis para alimentar cada vez mais suas idéias nos seus dias frios e solitários que ficaram martelando por anos a fio. E hoje, ela apenas queria o silêncio. Apenas queria ficar nua mentalmente. Apenas não pensar no ontem e no amanhã que poderia chegar. Queria se perder no perdido. Queria o escuro. O cinza. A malancolia e o descanso.
A chuva que agora dera uma calada e o dia que já morrera, a fez fechar os olhos sentada sobre uma poltrona no canto da sala e se lembrar do passado. Do que se foi e em algum lugar deve estar a lhe esperar. E, sem querer, pensando no futuro, com as mãos trêmulas, segurava a fotografia de 50 anos atrás, e a mente sobre o túmulo em que deixara sua última colheita de flores, a qual fazia regularmente, como modo de expressar todo seu amor e carinho por ele. Sempre através das flores, através de um ato, através de um olhar profundo, da alma...
As flores que agora murchas apenas segurava o orvalho que ficara sobre cada pétala, assim como a marca das lágrimas que rolaram tão timidamente, Jim ali adormeceu. Foi indo devagar, minuciosamente à algum lugar que o podia encontrar.
Juliana Sabbatini
Juliana Sabbatini
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